terça-feira, 22 de abril de 2014

O Haiti (não) é aqui

Em meio a confusão de partidas e chegadas geradas pelo feriado de Páscoa, em uma rodoviária que ainda estava em reformas para a Copa 2014, havia um haitiano perdido.

Era Sexta-feira Santa. Não se sabe quanto tempo ele ficou ali, parado de pé ao lado de sua grande mala, cheia de roupas e esperanças, olhando para a multidão indiferente. Só se sabe que em suas mãos tinha um papel surrado, repleto de números de telefone e nomes de compatriotas que talvez poderiam abrigá-lo e, com sorte, ajudá-lo a arranjar um emprego. Porém, como fazer telefonemas se todo o dinheiro que ele tinha foi gasto na passagem aérea para chegar ao Brasil, "a terra da oportunidade"? Essa história pode não ser grande coisa, mas havia um detalhe: ele mal falava o Inglês, e muito menos o Português.

Com esses preocupações na cabeça, ele viu que um brasileiro ao seu lado estava usando um aparelho celular. Esse rapaz estava ali para recepcionar um amigo que chegava de viagem, mas cujo ônibus estava atrasado. Timidamente, o haitiano perguntou se o brasileiro falava Inglês e se poderia ajudá-lo. Foi necessário um certo tempo para que a informação fosse compreendida foneticamente. Entretanto, ele abriu um grande sorriso quando o brasileiro disse "yes". Muitas ligações locais, estaduais e até mesmo nacionais foram feitas. (Todas na língua Kreyòl.) Mas, pelo visto, o estrangeiro não tinha para onde ir. Ainda. Então, eis que chega o tão esperado amigo do brasileiro. Os dois nativos se cumprimentaram de maneira calorosa. Obviamente, o primeiro contou ao outro sobre a situação do estrangeiro. Depois de conversarem sobre o que fazer, resolveram abrigar o haitiano momentaneamente. Afinal, o segundo brasileiro tinha feito uma longa viagem e já era quase hora do almoço.

Em casa, o anfitrião apresentou o haitiano à sua companheira. Inicialmente, ela levou um susto. Mas depois de saber de sua desventura, ela se compadeceu dele. Enquanto preparavam mais comida para a visita inesperada, receberam uma ligação interestadual. A pessoa do outro lado da linha havia sido contatada por uma daquelas para as quais haviam ligado antes. Não prometia muito, a não ser que o abrigaria e tentaria encontrar um lugar que pudesse empregar seu compatriota estrangeiro. O que já era uma esperança mais palpável. Assim, almoçaram. A conversa que se seguiu, apesar de dificultada pela barreira da língua, foi bastante amigável. Descobriram que o haitiano era eletricista, que tocava teclado e que frequentava a Igreja Batista. Por coincidência ou vontade divina, era a mesma fé do amigo do anfitrião.

Por fim, toca o celular novamente. Basta dizer que haitiano teria uma oportunidade de emprego há uns mil quilômetros dali. Viajou para lá na tarde de sábado, com passagem comprada pelos brasileiros. Contudo, não antes de passear tranquilamente pela cidade onde encontrou amigos para toda a vida.

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